terça-feira, 14 de junho de 2011

Queremos Taiguara de volta!


Fruto de uma união de talentos poucas vezes visto na historia da MPB e considerado até os dias de hoje uma inovadora obra prima, o Imyra, Tayra, Ipy - Taiguara é um importantíssimo patrimônio cultural Brasileiro. Mas não está disponível no Brasil e nunca foi gravado em CD – só em sites no exterior - porque a fita máster foi parar nas mãos de uma gravadora japonesa que detém ainda os direitos autorais sobre a obra. Imyra Chalar da Silva, filha de Taiguara, lançou em 2004, se não me engano, uma campanha de repatriamento da obra. Mas o próprio site oficial onde se poderia participar da campanha foi descontinuado e Imyra prossegue com a reivindicação através do Orkut e do Facebook.

Imyra Chalar da Silva, filha de Taiguara, que hoje mora em Miami, e coordena a campanha de repatrimento do disco

Eu tive a chance de comprar o disco em 1976, antes de ser recolhido pela censura, e tenho até hoje as músicas todas gravadas em MP3. Uma das músicas do disco que mais me marcou foi “situação”, música cuja letra talvez seja o prenúncio de seu destino :
Não, não adianta não
A situação já está fora das suas mãos
Nao, não adianta não

Como é que você vai me dar
o que já é meu
Como é que você vai criar
o que já nasceu

Como é que você resolveu
que eu sou livre,
Agora você esqueceu
Que só quem pode me libertar
sou eu

Voce diz que esse é o tempo
da vida se distender
Mas quem faz primavera é o inverno
nao e você

Volta sempre um momento na história
em que mais um império deixou de ser
Pois assim é o futuro p'ra nos
Só o que você vai mesmo fazer

É sair ou deixar eu me abrir
e deixar tudo acontecer
É sair ou deixar eu me abrir
e deixar tudo acontecer

A trajetória de Taiguara, um de nossos maiores compositores, carrega toda uma história de perseguição e boicote nas mãos da ditadura militar, quem recolheu o disco das prateleiras apenas 72 horas após o lançamento. No ano de 1976, este trabalho foi censurado e nunca mais disponibilizado em nossa terra. Em 2002, o disco foi lançado exclusivamente no mercado Japonês, tornando-se disponível para compra apenas em sítios estrangeiros. O reconhecimento internacional de nossas riquezas sempre será algo positivo, porem não é justo que o próprio Brasileiro tenha difícil acesso a uma parte tão importante de sua herança cultural.
Sobre o disco escreveu Thiago Filardi: ”Imyra é fruto de um período muito específico da nossa história, e mais ainda da história de Taiguara: o Brasil ainda vivia uma ditadura, apesar de mais branda que anteriormente, e o músico vivenciava uma perseguição implacável pela censura. Após inúmeras canções vetadas, um auto-exílio e um projeto abortado, era quase impensável que ele apostasse todas as forças num projeto tão grandioso e corajoso, que além de despender muito dinheiro com horas de estúdio, uma orquestra inteira e mais dezenas de músicos, era ainda mais virulento nas suas críticas ao governo, o que não significa que seja panfletário; ao contrário, Taiguara faz uso corrente da ironia e da metáfora e só é mais direto quando canta em espanhol (“Ay, Hermana/Qué hasta que el dia ese llegue/Tu no te canses, no mueras/Sin callas todas lãs represiones”).
Apesar de toda a complexidade melódica, harmônica e conceitual que envolve Imyra, não é difícil traçar suas influências e contextualizá-lo dentro daquele período, em que a música brasileira passava por grandes renovações estéticas, a exemplo da música livre praticada por Hermeto Pascoal (figura importantíssima para a configuração sonora deste LP), Egberto Gismonti e do pop/rock idílico, mas extremamente sofisticado do Clube da Esquina. Foi importante também para a concepção do tema, o livro Quarup, de Antônio Callado, de onde Taiguara tirou os nomes Imyra (a volta aos verdes musgos da infância), Tayra (o sêmen do tempo no ventre do universo) e Ipy ( o velho e o novo diante do infinito comum). É possível, portanto, esboçar um painel musical e ideológico que serviu de base para o conteúdo e estrutura cabalísticos do álbum, que incluem a fixação pelo número 7 (os dois lados divididos em sete canções, a faixa “Sete Cenas de Imyra”, e que também possui o andamento 7/8), a própria letra incompreensível de “Sete Cenas de Imyra” e as experimentações sonoras realizadas através de manipulações com fita, emulando sons da natureza e flertando com a música concreta – nesse ponto, a intervenção de Hermeto é mais que perceptível.
Seria injusto, entretanto, qualificar o valor da obra a Hermeto Pascoal (como já fizemos no disco Orós” de Fagner) e aos músicos de quilate que participaram da gravação, como Wagner Tiso (produção e regência de orquestra), Toninho Horta (violão), Jacques Morelenbaum (violoncelo), Lúcia Morelenbaum (harpa), Zé Eduardo Nazário (bateria e percussão), Nivaldo Ornellas (sax soprano, tenor e flauta), J.T. Meirelles e Ubirajara Silva, que toca bandoneon em “Primeira Bateria”. Todas as composições são de Taiguara, que além de cantar, toca piano, sintetizador e mellotron, assim como assina os arranjos e orquestrações ao lado de Hermeto. É claro que se o último não estivesse presente, o álbum não teria o mesmo teor experimental e as melodias talvez não fossem tão ricas, como assustadoramente são – e em certos fraseados lembram bastante o estilo veloz e altamente complexo de Hermeto justapor notas. Mas notemos a interpretação brilhante do cantor em “Sete Cenas de Imyra” que alterna, na distância de uma estrofe, um registro gravíssimo e outro extremamente agudo, ambos incômodos para qualquer vocalista. Ou então basta analisar Imyra faixa por faixa, para notar como Taiguara não só domina perfeitamente todas as nuances dos registros vocais, como passeia com segurança por diversos gêneros musicais, aos quais confere muita riqueza melódica. Tem bossa nova (“Terra das Palmeiras”), samba-canção (“Situação”), marchinha (“Primeira Bateria”), baião (a versão para “Três Pontas” de Milton e Ronaldo Bastos), além de elementos de jazz, rock e samba presentes em todas as músicas.
Imyra, Tayra, Ipy, Taiguara não só trabalha com muitas referências como subverte algumas delas. É o exemplo de “Terra das Palmeiras”, na qual a citação à “Canção do Exílio” de Gonçalves Dias é evidente (“Sonhada terra das palmeiras/Onde andará teu sabiá?”). Contudo, a citação mais genial do disco é a de “Aquarela de um País na Lua”, que pelo nome já remete à “Aquarela do Brasil” de Ary Barroso. Taiguara e Hermeto partem da célula melódica mais famosa da última para construírem um fraseado belíssimo, que servirá de melodia principal à faixa. Nesse momento, discurso sonoro e político andam juntos, pois se o intuito é desmantelar a velha noção nacionalista e romântica de Ary Barroso em plena ditadura militar, nada mais apurado que fazê-lo ao desconstruir e recontextualizar um de seus temas melódicos mais notórios.
No final, em “Outra Cena”, com a voz de Taiguara acompanhada apenas pelo piano, ele termina cantando “Só não sofreu quem não viu/Não entendeu quem não quis…”, o que nos lembra que seu companheiro Hermeto lançou, doze anos depois, um disco chamado Só Não Toca Quem Não Quer. Sobre Imyra, Tayra, Ipy e Taiguara, podemos afirmar que, apesar de não ter sido relançado no Brasil até hoje, existem as facilidades da internet e só não ouve esta pérola – resultado de uma confluência de gênios, mas catalisada por um só – quem não quer”.

A campanha de repatriamento é um apelo a gravadora para disponibilizar esta obra na sua terra natal. Ao aderir, você estará contribuindo em defesa da preservação de nossa cultura, e assim, cumprindo um dever cívico para cada Brasileiro que se orgulha de suas raízes. Agradecemos sua cooperação e esperamos poder contar com o auxilio de cada um de vocês para a divulgação de nossa campanha entre amigos, familiares, espaços virtuais e publicações relevantes a projetos culturais.
Taiguara Chalar da Silva (Montevidéu, 9 de outubro de 1945 - São Paulo, 14 de fevereiro de 1996) foi um cantor e compositor Brasileiro, embora nascido no Uruguai durante uma temporada de shows de seu pai, o Bandoneonista e Maestro Ubirajara Silva.
Mudou-se para o Rio de Janeiro em 1949 e para São Paulo, posteriormente, em1960. Largou a faculdade de Direito para se dedicar à música. Participou de vários festivais e programas da TV. Fez bastante sucesso nas décadas de 60 e 70. Autor de vários clássicos da MPB, como Hoje, Universo do teu corpo, Piano e viola,Amanda, Tributo a Jacob do Bandolim, Viagem, Berço de Marcela, Teu sonho não acabou, Geração 70 e "Que as Crianças Cantem Livres"; entre outros.
Considerado um dos símbolos da resistência à censura durante a ditadura militarbrasileira, Taiguara foi um dos compositores mais censurados na historia da MPB, tendo cerca de 100 canções vetadas. Os problemas com a censura eventualmente levaram Taiguara a se auto-exilar na Inglaterra em meados de 1973. Em Londres, estudou no Guildhall School of Music and Drama e gravou o Let the Children Hear the Music, que nunca chegou ao mercado, tornando-se o primeiro disco estrangeiro de um brasileiro censurado no Brasil.
Em 1975, voltou ao Brasil e gravou o Imyra, Tayra, Ipy - Taiguara com Hermeto Paschoal, participação de músicos como Wagner Tiso, Toninho Horta, Nivaldo Ornelas, Jacques Morelenbaum, Novelli, Zé Eduardo Nazário, Ubirajara Silva e umaorquestra sinfônica de 80 músicos. O espetáculo de lançamento do disco foi cancelado e todas as cópias foram recolhidas pela ditadura militar em poucos dias. Em seguida, Taiguara partiu para um segundo auto-exílio que o levaria à África e àEuropa por vários anos.
Quando finalmente voltou a cantar no Brasil, em meados dos anos 80, não obteve mais o grande sucesso de outros tempos, muito embora suas músicas de maior êxito tenham continuado a serem relembradas em flashbacks das rádios AM e FM.
Faleceu em 1996 devido a um persistente câncer na bexiga.
Discografia
Discografia (Parcial)
1965 - Taiguara! - Philips - LP
1966 - Crônica da Cidade Amada - Philips - LP
1966 - Primeiro Tempo 5x0 - Philips - LP
1968 - O Vencedor de Festivais - Odeon - LP
1968 - Taiguara - Odeon - LP
1969 - Hoje - Odeon - LP
1970 - Viagem - Odeon - LP
1971 - Carne e Osso - Odeon - LP
1972 - Piano e Viola - Odeon - LP
1973 - Fotografias - Odeon - LP
1974 - Let The Children Hear The Music - KPM-EMI - LP
1975 - Imyra, Tayra, Ipy - EMI-Odeon - LP
1981 - Porto de Vitória / Sol do Tanganica - Alvorada-Continental - Compacto simples
1984 - Canções de Amor e Liberdade - Alvorada-Continental - LP
1994 - Brasil Afri - Movieplay – CD
Comunidade no Orkut: http://www.orkut.com/Community?cmm=6412859&hl=pt-BR
No Facebook: http://www.facebook.com/pages/Imyra-Tayra-Ipy-Taiguara-Album-vetoedRepatriamento-do-disco-censurado/271469219151

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